Conversámos com o escritor Richard Zimler sobre o seu 7º livro para crianças, intitulado Ernesto, por que o escreveu e como o tem levado até às escolas.
A narrativa apresenta um menino robô, programado para ser artista e pintar com sentimento. No processo, Ernesto descobre emoções e desenvolve consciência de si próprio. É uma história de afetos e de respeito pela individualidade humana ou não-humana.
Inspiradas por esta obra, convidámos Richard Zimler a partilhar mais sobre porque escreveu este livro e como o tem levado até às escolas.
A origem da história
A origem do livro tem mais de 20 anos, quando Richard leu sobre as leis da robótica definidas pelo autor de ficção científica Isaac Asimov – três regras para controlar o comportamento dos robôs – e que o levaram a refletir sobre a necessidade de definir também direitos para os robôs:
«Achei tudo bem, engraçado, importante, mas a minha cabeça deve funcionar de forma diferente. Porque eu pensava: e os robôs? Eles não têm direitos?
Se um robô desenvolver memória, desejos, dificuldades, se quiser ter um futuro e realizar os seus sonhos, não precisamos de leis que também o defendam?»
Inicialmente escreveu o Ernesto como um conto para adultos que foi publicado nos Estados Unidos numa revista pequena. Vinte anos mais tarde, uma editora inglesa retomou o interesse na história dizendo que faria um excelente livro para crianças. Richard escreveu a história para as crianças, mas foi pela mão da Porto Editora e em colaboração com a ilustradora Natalina Cóias, que em 2024 o Ernesto chegou às livrarias.
Ernesto na escola
Há muitos anos que Richard visita escolas portuguesas para conversar sobre os seus livros – já participou em mais de 400 sessões. O seu objetivo maior é inspirar as crianças a serem os futuros escritores, expressando o que sentem, observam e pensam de forma livre.
«Eu acho que o mundo precisa de contadores de histórias. Os contadores de histórias que hoje em dia têm sete, oito, nove anos, possivelmente vão ter uma outra maneira de contar uma história que eu não posso prever. Eu quero participar, se quiser, naquela história de literatura. Quero fazer parte desse contínuo de literatura de uma pessoa já adulta para um jovem.»
No caso do Ernesto, os convites para uma conversa entre o escritor e os/as alunos/as têm vindo sobretudo de professoras do 1.º ciclo do Ensino Básico. As turmas leem a obra em sala de aula e preparam-se para receber o autor numa sessão de leitura e conversa.
As crianças exploram o livro de várias formas, focando-se em temas como:
- Emoções
- Expressão e representação das emoções
- Memórias
- Identidade
- Diferença entre humanos e máquinas
Conversar com o escritor
As sessões começam por uma apresentação do Richard Zimler às crianças, partilhando quem é o autor, porque escreveu o livro e como foi o processo de escrita e de ilustração. Richard faz questão de partilhar as dúvidas, erros e incertezas ao longo da criação, para que as crianças percebam que a aprendizagem é feita de tentativas, também para os adultos.
Richard lê excertos da história e lança questões. Uma das mais fortes é sobre o momento em que Ernesto olha para o espelho e percebe que existe e isso cria uma crise:
‘Eu não sou simplesmente uma máquina. Eu tenho a minha vida própria.’
O escritor então pergunta às crianças se se lembram da primeira vez em que perceberam que eram independentes dos pais. Muitas partilham memórias tocantes, como:
«Sim! eu estava ao colo da minha mãe e lembro-me de ter olhado para a cara dela e percebi que eu era diferente, que eu era a pessoa a olhar para a minha mãe.»
As crianças fazem perguntas diversas e algumas surpreendem, como um aluno de Fafe, com mais de sete anos, que perguntou:
«Quantos livros é que o senhor ainda não escreveu? – uma pergunta maravilhosa, quase budista.»
Imaginação e futuro
Nos momentos de conversa com as crianças, para o autor, é muito importante que elas se sintam acolhidas e incentivadas a imaginar. Porque quando o futuro é incerto, precisamos de exercitar a imaginação para viver melhor o presente e criar novas soluções para o futuro e, “as crianças são o futuro”.
A imaginação é expressa também através dos desenhos feitos pelas crianças, antes ou depois da sessão. Muitas vezes, inspiram-se no Ernesto para fazer retratos ou auto-retratos.
Para Richard, este treino é essencial:
“Os jovens hoje em dia vão criar maneiras de lidar com máquinas e robôs e Inteligência Artificial que nós, já tenho 69 anos, que nós não conseguimos imaginar. E isso é bonito. É um futuro que não é previsível. Que bom.”
